A partir de um estudo de caso, este artigo discute como práticas de tortura têm sido utilizadas em interações sociais que envolvem agentes privados. Em particular, de que maneira a expansão de novos atores no exercício do controle social no país, como é o caso das empresas de segurança privada, têm colaborado para uma nova compreensão do uso da violência e de que forma essa prática e a repressão aparecem como dispositivos presentes nas rotinas de controle, proteção patrimonial e vigilância de espaços comerciais. Por meio da análise documental do inquérito policial que apurou um caso de tortura de um adolescente, ocorrido em um supermercado na cidade de São Paulo, procuramos trazer alguns elementos para essa reflexão. Somado a isso, argumentamos como estas novas configurações da tortura, com contextos e atores cada vez mais plurais, acabam por refletir também na percepção daqueles que são incumbidos de classificar, processar e punir legalmente indivíduos por práticas de tortura, ou seja, como os atores do sistema de justiça criminal atualizam os significados desse tipo de violência através de suas próprias compreensões e reinterpretações polissêmicas acerca da prática da tortura. Depreende-se, portanto, como a tortura além de estar presente em contextos cada vez mais diversos, tem igualmente servido para perpetuar relações de poder historicamente baseadas na desigualdade social e racial.
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